O PROFESSOR POSTO A PROVA (3ª parte)
Por: Paulo de Camargo – Revista de Projeto Pedagógico 2012 – Diretor UDEMO
Formação
O desenvolvimento de bons instrumentos de avaliação vem sendo tratado nas universidades quase sempre do prisma teórico. Contudo, os professores se sentem desamparados e desorientados na escola, como demonstrou a pesquisa empreendida por Dirce Moraes.
Visitando escolas e conversando com professores, Dirce percebeu que não havia qualquer orientação em
relação à elaboração das provas, à correção e às tomadas de decisão após os resultados. "Cada professor fazia da forma como achava certo", conta. Entre alguns bons exemplos, Dirce encontrou questões simplesmente retiradas de livros, enfatizando somente a memorização, sem preocupação de contextualizar as perguntas.
Na verdade, como demonstra a pesquisadora Bernadete Gatti, da Fundação Carlos Chagas (FCC), em seu livro Professores do Brasil - Impasses e Desafios, no qual analisou currículos de cursos de pedagogia de todo o país, muitas vezes o docente reproduz práticas que encontrou na graduação.
Nas faculdades, o método mais comum de avaliação é a prova escrita, como a que posteriormente ele proporá aos seus alunos. O problema é que as consequências desse despreparo remetem diretamente a questões graves da educação brasileira, como o fracasso escolar.
"Um trabalho sistemático com a orientação dos professores, a formação continuada e conscientização sobre a responsabilidade de cada um no processo colaboram significativamente com o sucesso do aluno, distanciando-o do fracasso escolar", diz.
Distorções
Um estudo importante nesse sentido foi desenvolvido por Ricardo Madeira, da Faculdade de Economia e Administração (FEA), na USP, há três anos. Comparando as notas do Sistema de Avaliação do
Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp) e as atribuídas pelos professores em sala, Madeira encontrou distorções reveladoras.
Percebeu, por exemplo, que enquanto no Saresp as notas distribuem-se na forma de um sino, ou seja, mais ou menos igualmente, nas classes tendem a se aglutinar. "O professor tende a dar nomes iguais para
alunos diferentes", diz.
A pesquisa mostrou que os testes que constantemente ranqueiam os alunos para baixo podem desmotivar e causar o abandono. "A prova traz uma influência importante sobre a decisão dos alunos", diz.
Para ele, o descolamento entre as notas do professor e do Saresp pode indicar simplesmente que os docentes reconhecem que a prova não é um instrumento perfeito, o que reforça a necessidade de se utilizar variados instrumentos de avaliação.
Mas há ainda outros aspectos importantes que ligam a cultura do exame escrito aos problemas de aprendizagem. Um dos principais é justamente sobre o que se costuma fazer com os resultados dos testes.
Quase sempre, nada.
O pesquisador Luckesi chama a atenção para o fato de que a simples atribuição de valores numéricos não significa que houve um processo de avaliação formativa, ou seja, que produza reflexos sobre a aprendizagem. A prova deveria ser o primeiro passo, e não o final, de um processo como esse. Há muito a ser feito, como identificar e trabalhar com as turmas sobre pontos que se mostraram difíceis, ou como lançar um olhar mais individual para o desenvolvimento de cada aluno.
"O feedback possibilita que ele se situe em relação às aprendizagens, tenha condições de entender e não apenas constatar seus erros e acertos. É preciso refletir, propor situações em que o aluno possa compreender o que fez e o que deixou de fazer em relação ao que foi proposto", enfatiza Dirce.
O argumento dos professores - e não desprovido de razão - é o problema do número de estudantes em sala, que inviabiliza um tratamento individualizado.
"É possível que não consiga atender a todos, mas se propuser diferentes situações em que os alunos possam trabalhar na superação das dificuldades constatadas, isso vai contribuindo para o avanço. O que não pode acontecer é a prova apenas atestar a competência ou a incompetência do indivíduo com uma nota", alerta a pesquisadora.
Tratar a prova como uma reta de chegada é como olhar o termômetro e se satisfazer com o que ele indica, sem procurar as causas da febre. Para Luckesi, a preocupação única com aprovação ou reprovação acaba por afastar o gestor e o professor daquilo que ele efetivamente procura ao propor um teste - ou seja, encontrar dados para as decisões que terá de tomar, decisões que podem influenciar o futuro de milhares de vidas.
Uma boa prova
Veja algumas dicas de como elaborar a avaliação escrita em sala de aula, segundo diferentes autores:
1) Ter clareza do objetivo de cada pergunta. É preciso haver intencionalidade.
2) Buscar que sejam adequadas ao nível dos alunos, com questões bem distribuídas, entre fáceis, médias e difíceis.
3) Elaborar as questões com perguntas que sejam relevantes e evitar pegadinhas. Tem de ter um tema
predominante. Evitar os extremos: nem tão geral, nem tão específico, pedindo "a nota de rodapé".
4) Se possível, buscar contextualizar os problemas ou, pelo menos, procurar apresentá-los de forma a provocar o raciocínio e evitar somente respostas memorizadas.
5) Ser rigoroso com a linguagem, evitando perguntas genéricas. O comando, ou seja, o que se quer de cada resposta deve estar muito claro. Evitar o uso de questões com o uso de negativa, que posteriormente prejudicam a análise da prova.
6) Ser coerente com as aulas e as estratégias previamente utilizadas nas aulas.
7) Evitar provas exaustivas, que demandam muito tempo de realização. Isso não contribui para a qualidade do instrumento.
8) Planejar a prova com antecedência, com tempo para reler as questões, refazê-las e depurá-las.
9) A escolha do formato deve estar a serviço do objetivo. Questões de múltipla escolha podem ser tão
boas com quatro opções do que de cinco, por exemplo. Para o Ensino Fundamental I, é melhor utilizar três alternativas; para o Ensino Fundamental II, quatro.
10) Atenção aos detalhes: cuidado com a correção gramatical, e com o uso de gráficos com cores e tamanhos que depois podem ser prejudicados na reprodução.
REFLEXÃO
A prova é o instrumento mais utilizado pela sociedade para medição e cobrança. O erro muitas vezes é usado para humilhação, é motivo de reprovação e diagnóstico de incompetência.
Comente e sugira mudanças possíveis em nosso cotidiano de avaliação escolar.